PARTE2
INICIANDO A SUBIDA
Dia 8 6 fev 570m- 3130 6 h da manhã, último banho
com água. Mastigamos alguma coisa, e partimos para a estação de Metrô, com
mochilas pesando 30 kg, lotada de equipamentos e comida. Botas duplas e piolets
presos no lado de fora da mochila. Sendo um sábado em Santiago, àquela hora da
manhã estaria muito frio para o metrô estar cheio, e mesmo que estivesse, as
pessoas não estariam nem um pouco interessadas nas duas figuras com mochilas
enormes e material de montanha, utilizando o metro numa manhã de sábado de
verão. Se estivessem acordadas, estariam elas ocupadas em seus pensamentos
lamentando porque acordaram tão cedo. Ainda estava escuro! E frio!
Por volta das 7h30, descemos na estação a qual
pegaríamos o 1º ônibus que iria para a Região do Cajon Del Maipo. Quase não
conseguimos passagem. Creio que o Cajon del Maipo é um bom destino de verão
para grande parte dos Santiaguinos, com vários locais para banho para amenizar
o calor, deixando as estancias e campings lotadas de famílias e adolescentes.
Famílias vão de carro. Adolescentes de ônibus. E fazendo muito barulho! André e
eu estávamos naquele inferno austral de verão com nossas mochilas
gigantes, em trajes totalmente diferentes dos demais, com objetivo de entrar no
ônibus, nos livrarmos um pouco das mochilas e conseguir tirar um cochilo até
chegar no nosso destino.
Embarcamos, e como já havíamos feito parte do trajeto dias antes de carro, aproveitamos para dormir um pouco no ônibus, nos preparando para a subida que seria grande. Chegamos o povoado de Baños Morales a 1800m de altitude, por volta das 11h30. Comemos empanadas fritas, ligamos o GPS e saímos a caminhar em direção ao início da trilha para o Volcán San José. De Baños Morales até o lugar conhecido como El cabrerio (início da trilha) são cerca de 7 km pela estrada de terra que dá acesso ao outro vilarejo - Baños Colina.
Começamos a andar em
terreno plano, passando alguns riachos e nos aproximando da trilha de subida. A
quebrada Sur, com subida para o refúgio, estava bem marcada com trechos
empinados revezando terra com pedras soltas e subida que não acabava mais. Por
volta das 19h, com bastante luz ainda, chegamos ao Refúgio. Ficamos felizes, por
não ter que armar barraca, pois havia vaga para dormir nas camas do abrigo (beliches
feitos com arames servindo de estrado) e havia água abundante em frente ao
refúgio.
Lá encontramos uma brasileira que estava com
uma turma, e que iriam descer na manhã seguinte, pois seu objetivo era ir só ao
refúgio. Conhecemos um senhor que estava já alguns dias (esperando uma janela
de tempo bom para fazer cume e que nesse dia havia desistido, depois de alguns
intentos) e uma dupla de chilenos que haviam subido no mesmo dia, e estavam com
o mesmo plano que nós de fazer cume. Logo, não estaríamos tão sozinhos no dia
seguinte. Batemos algum papo, jantamos batatas com arroz e atum, deitamos nas
camas, empacotamo-nos nos sacos de dormir e desmaiamos.
vista da quebrada sur desde Valle de la engorda
André entrando na quebrada sur
subindo e subindo
Dia 9 07 fev. 3130m.- 4200m Dormimos confortavelmente no refúgio. Os sacos de dormir e as roupas que levamos aguentaram bem o frio, tendo como resultado uma manhã preguiçosa em que levantamos já por volta das 9h. O dia seria longo, teríamos que sair do abrigo a 3130m de altitude e chegar no acampamento 01 a 4200m. Porém, já conhecendo nosso ritmo de caminhada e sabendo que nessa época teríamos sol até cerca das 22h, optamos por descansar um pouco mais e sair mais tarde.
Café da manhã tomado,
comida de trilha pronta, mochilas prontas, partimos do nosso confortável abrigo
para ir em busca da 1ª noite ao relento no coração dos Andes Centrais. A partir
daí, já utilizaríamos as Botas Duplas pois haveria trechos com neve, deixando
nossas botas de aproximação no abrigo, e alguma comida para utilizarmos na
volta dali a 2 dias. Os chilenos haviam saído um
pouco mais cedo, e nós seguíamos sozinhos pelo caminho ora batido, ora seguindo
a rota do no GPS.
Depois de aproximadamente
1h30 caminhando, chegamos numa subida exposta ao vento, cheio de lacas soltas
chamada de Las Lajas. Tomando cuidado para não jogarmos pedras soltas um
no outro, terminamos a subida e tomamos um fôlego para continuarmos. A partir
desse ponto, caminha-se em direção a um vale, em que a trilha passa bem em
frente a um enorme glaciar e depois segue subindo o vale para ir em direção ao acampamento.
Paramos antes da subida para almoçar e avistamos já bem acima, os chilenos
chegando no alto, bem acima do vale.
Após a refeição, iniciamos
a subida, e após algum tempo, reparamos que o trajeto ficou um pouco mais
íngreme do que esperávamos, com trechos de escalaminhada em neve, sendo que em
dado momento já estávamos usando os piolets para equilibrar.
“- O relato do site
não dizia nada disso, ou eu não entendo nada de espanhol” pensei. Estávamos em
uma subida empinada de neve com uma inclinação nada amigável e que findava no
fim do vale o qual minutos antes estávamos confortavelmente almoçando. O medo
começou a tomar conta de nós. No meio da subida, cansados e com bastante
cagaço, paramos para tomar água e “vuuuuuuuuuuuuuuuush” nossa garrafa de 2
litros foi escorregando neve abaixo. Descer, nós não iríamos para buscá-la. Só
nos restava subir. Se não dava para ir sem medo, foi com medo mesmo de terminar
no fundo do vale, escorregando ao encontro de nossa garrafa. Terminamos a
subida cansados, exaustos, putos e com muito vento na cabeça. (Soube pelos
chilenos já no acampamento 1, que havia uma trilha que desviava dessa subida).
Olhamos o GPS, e ainda faltavam cerca de 200m de desnível na neve...
De pouco em pouco, fomos
nos arrastando, mais parando do que andando e por volta das 18h30 chegamos no
acampamento 1. André já estava sofrendo com dores de cabeça e náusea. Arrumamos
rápido nossa barraca, e tratamos de fazer um chá com folhas de coca (que eu
tinha ainda da minha última viagem da Bolívia)
e dei um comprimido de Dexametasona(que minha mãe utilizava para aliviar
os efeitos da quimioterapia) para o André e minutos depois o menino já estava
de volta a vida.. Tratamos de procurar água antes que a temperatura caísse e
ela congelasse (nesse acampamento ainda há como encontrar água em estado
líquido em alguns pontos embaixo das pedras), fizemos nossa janta (macarrão com
linguiça e ovo) , trocamos umas palavras com os chilenos e fomos dormir mais
cedo do que esperávamos.
Dia 10. 8 fev 4200m – 4800m Apesar de estarmos acampados, a noite foi bem tranquila. O lugar do acampamento era abrigado do vento, além de ter várias pircas (montes de pedras agrupados que cortam os ventos) para montar as barracas. Repetindo o esquema do dia anterior, os chilenos saíram mais cedo que nós. Tomamos café, desmontamos acampamento e arrumamos as mochilas, tudo isso num esforço gigantesco para lidar com a altitude que já começava a cobrar seu pedágio por estarmos naquele lugar. Iniciamos a caminhada devagar, com todo o peso da mochila (por mais que comêssemos as provisões, a mochila parecia que aumentava de peso) e depois de cerca de 1h encontramos os chilenos descansando e calçando seus crampons e se armando com os piolets para atravessar um vale e iniciar uma longa subida. Perguntei a eles se era necessário mesmo, e ao que me responderam positivamente que sim, pois com o sol já no alto, e a neve antes endurecida, começava a derreter e ficar escorregadia. Nuestros amigos então partiram na frente, em um ritmo de marcha bem mais forte que o nosso e nós paramos para descansar e aprender a colocar os benditos dos nossos crampons.
Depois de uma surra para ajustar os equipamentos, iniciamos a caminhada pelo vale, minutos depois começamos a ouvir pedras (pequenas, mas pedras) deslizando vale adentro. Foi então que avistamos uma pedra gigante equilibrada em um bloco de neve. Olhamos o sol a pino, então imaginamos o que aconteceria se houvesse um bloco desse acima de nós e a neve derretesse, e o bloco deslizasse vale abaixo. Apertamos o passo o quanto deu, cruzamos o vale e chegamos a uma subida num campo de penitentes. Essas formações de neve endurecida e pontiagudas, são um verdadeiro inferno para transpor: você tem que achar a melhor rota para desviar desses obstáculos que podem medir sua altura, subindo com crampon e piolet, carregando sua mochila pesando uns 25kg , com respiração ofegante no ar rarefeito.. Até então eu só tinha lido a respeito. E espero não encontrar um desses de novo.
campo de penitentes(são essas formações que vistas de longe,
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